Com base mais infiel em 30 anos, governo Lula deve “ideologizar” ações
Os auxiliares da gestão apontam que o caminho, a partir de agora, inclui intensificar o discurso de “ricos contra pobres” para incomodar o Legislativo. Objetivo é fortalecer as mudanças tributárias promovidas pelo Executivo

Com a base mais infiel dos últimos 30 anos dentro do Congresso Nacional, o governo Lula (PT) deve “ideologizar” as ações. Além disso, para emplacar suas pautas também deve judicializar tudo o que for possível. Ao mesmo tempo, interlocutores têm afirmado, de forma contraditória, que o presidente quer esperar esfriar as tensões com o Legislativo para, depois, retomar os diálogos. Sobre esse assunto, o cientista político Lehninger Mota, explicou que, com a popularidade em baixa, o apoio do centrão fica sempre mais caro — no sentido de liberação de emendas e de ministérios. Diante disso, o especialista disse que existem dois caminhos não excludentes para o governo.
“O primeiro é esse de ir para cima, se aproximar mais da esquerda, da centro-esquerda, fazer pautas mais ligadas às parcelas mais pobres, carentes e enfrentar o Congresso dessa forma. E a outra maneira é a judicialização de tudo que for possível — contar com apoio do Supremo Tribunal Federal [STF]”, disse Lehninger. O cientista político ponderou que está muito claro que, independente do diálogo e da liberação de emendas, as medidas têm enfrentado dificuldades no Legislativo: “E uma das coisas que não se pode culpar o presidente Lula é de falta de diálogo”.
Lehninger relembrou que Lula fez uma grande viagem para o Japão com os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), onde negociou todos os aspectos de como seria a relação, mesmo com a noção de que vários desses partidos que integram, inclusive, ministérios do governo Lula têm muita dificuldade em votar todas as pautas que o governo precisa.
“E sempre, mesmo dando ministérios, a negociação nunca fica no atacado. A cada aprovação de uma coisa que tem o interesse do governo federal, do presidente, você tem que liberar emendas. Você vê várias pessoas do PP [Progressistas], que integram os ministérios, União Brasil, que integram os ministérios, votando contra questões importantes para o governo”, concluiu.
Radicalização e judicialização
Nesse aspecto, o cientista político afirmou que existem dois caminhos possíveis para o presidente Lula. “Essa radicalização — não vou dizer radicalização, vamos dizer uma ideologização das ações em que o ‘governo defende mais os mais pobres e o Congresso não está preocupado com os pobres’ tentar pregar essa peça no Congresso — e a outra forma é o enfrentamento, sempre que possível, levar para o Judiciário, no caso o Supremo Tribunal Federal. Das duas formas, não vejo uma alternativa em que o governo consiga realinhar os apoios para aprovar pautas importantes dentro do Congresso”, disse.
“Porque a forma como [Hugo] Motta colocou as coisas para serem votadas fez o governo ter essa derrota na questão do IOF. Ele nem tentou. Não tentou falar: ‘Eu estou sendo pressionado, nós vamos ter que pautar, vamos pautar tal dia, e aí vocês dialogam aí’. Não. ‘Eu vou pautar’, foi à noite, decidiu no outro dia e já negociou com o Senado, com o presidente do Senado, que parece estar mais ligado ao governo, mas que também não tomou nenhuma providência para adiar a votação. Então, foi uma coisa meio que deliberada”, completou.
Impopularidade
Lehninger argumentou que, com a popularidade em baixa, o apoio do Centrão fica sempre mais caro — no sentido de emendas e no sentido de ministérios. “Então, o Lula tem dois caminhos: essa ideologização da sua comunicação — dizer que o Congresso não está alinhado com as necessidades dos mais pobres e que não está aprovando — e judicializar o que for possível por meio do Supremo. E aí sim, acirrar as tensões com o Congresso”, reiterou.
Conflito entre Poderes
O especialista apontou que vai ser um acirramento de tensões entre os Poderes. “Ou esperar julho entrar e tentar dar uma abaixada nos ânimos e dialogar mais, entender qual é o caminho que eles querem tomar e viver nessa montanha-russa. […] Ora o Congresso aprova o que ele quer, ora não, ora vai, ora não.”
“Ou então convocar todos para desmobilizar esse arranjo institucional que foi feito para essa questão do teto de gastos e ver uma nova forma, um novo modelo, discutindo que todos embarquem nesse novo modelo — cortando gastos: o Judiciário, o Legislativo, o Executivo — para tentar fazer esse balanço. Essas são algumas das formas que o governo pode tentar. Mas o cenário é complexo”, pontuou.