Hospital público especializado em câncer infantil propõe atendimento humanizado em Goiás: ‘Acolhimento e até comida personalizada’
Cora está localizado em Goiânia e alia tecnologia ao lúdico para tornar ambiente acolhedor e eficiente no tratamento de crianças. Atendimentos já começaram a ser feitos, mas inauguração oficial acontece nesta quinta-feira (25).

O Complexo Oncológico de Referência do Estado de Goiás (Cora) tem oferecido tratamento a crianças diagnosticadas com câncer em Goiás. O hospital é o primeiro da rede pública destinado ao tratamento de câncer infantil no estado. Inaugurado oficialmente nesta quinta-feira (25), a unidade opera desde junho de 2025 e já fez a diferença na vida de famílias que precisariam se mudar ou viajar para outros estados para realizar o tratamento de crianças.
O Cora está localizado Residencial Barravento, em Goiânia, e foi construído em 2 anos. A família de Henry Gabriel, de 5 anos, está entre as que foram acolhidas no hospital. De acordo com a mãe dele, Emanuela, de 24 anos, o menino faz tratamento para leucemia linfoide aguda (LLA). Ele estava internado no Hospital Estadual da Criança e do Adolescente (Hecad) e ficou 11 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Com a suspeita de câncer, ele foi encaminhado ao Cora, recebeu o diagnóstico e iniciou o tratamento, há dois meses. Toda semana, a família, que é de Trindade, vai até o hospital realizar exame de sangue e quimioterapias.
“É muito difícil receber um diagnóstico desses, mas aqui a gente sempre foi bem recebido. A estrutura é muito boa. Quando fica internado na enfermaria, eles fazem comida personalizada, do jeito que a criança quer”, relatou.
Emanuela conta que a abertura do hospital permitiu que ela e a família continuassem em casa. “Eu sou muito grata a Deus pelo hospital ter ficado pronto a tempo, porque quando ele veio aqui, não fazia nem um mês que tinha começado as atividades no hospital. Se não tivesse ficado pronto, provavelmente a gente tinha que ir para outro estado e ficar longe do meu outro filho”, disse .
A família da pequena Ayla, de 6 meses, também está entre as que iriam realizar tratamento em Brasília, mas passou a receber atendimento na capital. A família é de Trindade.
Francilene Ferreira dos Santos, de 45 anos, contou que recebeu o diagnóstico da filha logo após o seu nascimento. A pequena possui síndrome de down com leucemia transitória, um caso raro. De acordo com a mãe, quando o hospital começou a funcionar, Ayla ainda estava internada em uma UTI em outra unidade antes de ser encaminhada ao Cora.
“No parto, foi tudo um susto. A gente espera ganhar neném e vir para casa, não ficar no hospital. Ela ficou lá por três meses, a Ayla ficou muito pálida, pegou sepse três vezes, para mim ela foi um milagre vivo. Até os médicos falam que nunca houve um diagnóstico como o dela, no estado em que ela chegou, aqui em Goiás”, relatou.
Ao chegar no Cora, a família foi encaminhada para um oncologista, mas também recebeu atendimento de vários especialistas, como nutricionista, psicólogo e fisioterapeuta.
Segundo Franciele, o hospital é importante para a recuperação dos pacientes, mas também para a união da família que enfrenta o diagnóstico.
“A gente sofre de ter que ir para longe, quem trabalha e depende do trabalho, como vai se deslocar? Por exemplo, eu tenho outro bebê de dois anos. Se eu tivesse que fazer esse acompanhamento com ela lá em Brasília, ia ser muito puxado. Meu marido ia ter que pedir conta no trabalho e começar uma vida por lá”, disse.
Demanda infantil foi priorizada
Devido à complexidade do projeto do Cora, a entrega da unidade está prevista para ser realizada em três fases, sendo que a primeira é a prestação de serviços ao público infanto-juvenil com 60 leitos, por conta da alta demanda.
“Percebemos que os pacientes de Goiás necessitavam muito de outros serviços de outros estados, principalmente o pediátrico. A gente tinha uma capacidade instalada aqui em Goiás, pelo Hospital Araújo Jorge, de mais ou menos 50% dos atendimentos necessários para o Estado inteiro. Então, muito paciente ia para Brasília e São Paulo”, relatou diretor técnico do Cora, Mário José Aguiar de Paula.
Com o objetivo de ser uma referência nacional, o hospital conta com uma estrutura moderna e equipamentos de alta tecnologia. A unidade recebeu os seus primeiros pacientes em junho deste ano, em fase de pré-operação, e já realizou mais de 2 mil atendimentos, de acordo com o médico.
Colorido e decorado com animais do cerrado, o ambiente lúdico do hospital foi pensado para acolher o público infantil. Com o intuito de ser menos assustador para as crianças, o complexo conta com setores coloridos, uma brinquedoteca e salas de jogos. Para Mário, esse ambiente é crucial para a adesão do paciente ao tratamento.
Além disso, o complexo conta com um setor de transplante de medula óssea, centro cirúrgico, robôs para reabilitação de movimentos e um avançado sistema de filtragem do ar, que é o único no estado, de acordo com a administração.
Financiamento e apoio
De acordo com o diretor, o hospital irá contar com o apoio de artistas e do setor privado para a construção de duas casas de apoio para oferecer hospedagem e suporte aos pacientes e suas famílias. Uma das apoiadores do projeto é a cantora sertaneja Ana Castela.
Segundo Mário, a ideia da criação do complexo surgiu há cerca de três anos, a partir do governador Ronaldo Caiado (UB) e do presidente da Fundação Pio XII.
Profissionais dedicados a fazer a diferença
Em entrevista ao g1, a médica goiana Giovanna Patriarcha Borges dos Santos, de 37 anos, contou que, desde o início do seu funcionamento, o hospital tem recebido muitos casos de leucemia, linfoma, e de tumores do sistema nervoso central (SNC). Além disso, já foram atendidos tumores ósseos, abdominais, renais e de fígado.
“Os pacientes têm recebido tratamento cirúrgico com a melhor estrutura possível. A gente tem UTI pediátrica, os pacientes mais graves ou até em fase de diagnóstico vão para lá. E a enfermaria que está com 18 leitos funcionando e, muitas vezes, com todos ocupados. A gente utiliza tudo”, relatou.
A médica destacou que iniciar a prestação de um serviço do zero é desafiador. “É um desafio bom, que a gente compra com muita alegria, força de vontade para fazer dar certo. Acho que essa é a intenção de todo mundo aqui”, disse Giovanna.
Em três meses de funcionamento, o Cora superou as expectativas. Desde junho, o hospital realizou mais de 2 mil consultas, mais de 300 sessões de quimioterapia, e 192 cirurgias, incluindo 18 em tumores do SNC.
A equipe multidisciplinar é composta por cerca de 70 médicos, seis oncologistas, além de assistentes sociais, fisioterapeutas, psicólogos e fonoaudiólogos.
Funcionamento do hospital
O funcionamento do Cora será de 24h por dia, todos os dias da semana. Já o atendimento ambulatorial deverá funcionar das 7h às 19h, de segunda a sexta-feira. Neste início de atendimento ao público, o Cora dispõe do atendimento em oncologia pediátrica, ortopedia pediátrica, cirurgia pediátrica e neuro-oncologia pediátrica. O atendimento é por encaminhamento do Sistema Único de Saúde.
A unidade vai atender a pacientes de 0 a 17 anos, 11 meses e 29 dias em casos de suspeita de neoplasia infanto-juvenil, neoplasia maligna de origem hematológica ou tumores sólidos. Já os pacientes da faixa etária de 18 anos a 23 anos, 11 meses e 29 dias serão atendidos nos casos de diagnóstico de neoplasia maligna de osso.
Investimento e inovações
Inspirado no Hospital do Amor, em Barretos (SP), o Hospital Cora tem mais de 44 mil metros quadrados de área construída, conforme divulgado pelo Governo de Goiás. Nesta primeira etapa, foram mais de R$ 255 milhões de investimento. O valor total estimado do projeto é de pouco mais de R$ 724 milhões.
Entre as inovações tecnológicas do Cora, o sistema de filtragem de ar é considerado um dos mais importantes porque busca garantir a segurança dos pacientes que passarão por transplantes de medula óssea. O diretor técnico explicou que o ambiente é 100% estéreo e previne infecções.
Outro avanço é a reabilitação com robótica, uma tecnologia que, segundo o diretor, não existia no estado. Os robôs auxiliam na reabilitação de membros inferiores e superiores de pacientes com sequelas motoras.
O hospital também conta com uma ressonância magnética ligada diretamente ao centro cirúrgico. Isso permite que, em caso de remoção de tumor cerebral, a criança consiga fazer a ressonância antes de fechar a cirurgia para verificar se restou algum resíduo, pontuou o médico.
Apesar da ampla tecnologia, Mário não considera esse o ponto mais importante do tratamento. “A tecnologia não trata o paciente”, disse. O especialista mencionou que as tecnologias servem como apoio, mas o que realmente importa é a humanização e o acolhimento.
Capacidade de atendimento
O Cora conta com 10 leitos de enfermaria cirúrgica pediátrica, 8 leitos de enfermaria pediátrica transplante de medula óssea (TMO), 19 leitos de enfermaria pediátrica clínica, 12 leitos de pronto-socorro observação pediátrica, 6 leitos de UTI pediátrica e 5 leitos de UTI TMO Pediátrica.
Nesta primeira etapa, o Complexo poderá realizar cerca de 31 cirurgias eletivas e internas por mês, além de 50 atendimentos no pronto-socorro, 32 pequenos procedimentos, 280 consultas médicas, 560 consultas multiprofissionais e 264 sessões de quimioterapia.